É uma cena que sempre me aflige e entristece, nesta cidade amazônica. Um caminhão carregado de toras.
Desfilam impassíveis pela cidade, com destino programado: gerar lucro.
E penso que seja de se espantar que, diante dos incontáveis alarmes disparados pela natureza, ameaças reais à sobrevivência desta humanidade e das gerações futuras, ainda haja tantos indivíduos convencidos de que trocar a vida por dinheiro é bom negócio.
Iludidos e satisfeitos, atrás de si deixam a floresta devastada, como o violentador que levanta as calças e trata de esquecer o crime que cometeu.
Já estive numa área de mata derrubada e posso afirmar que é uma das visões mais desoladoras que se pode ter. Causa uma sensação de solidão, escassez, medo e desconsolo sem igual. No cenário desértico, os poucos pássaros que restam, confusos, parecem se perguntar, quando cantam: “O que houve aqui?”
É inevitável, para uma pessoa humana, pensar em todas essas coisas quando vê um caminhão de toras. E sobre tal fato eu refletia enquanto conferia, outro dia, o enorme tronco, imaginando quão majestosa teria sido aquela criatura em pé, na floresta. Uma senhora respeitável, uma anciã, sabiamente reverenciada por muitas culturas tradicionais, por sua dimensão, qualidade ancestral e vitalidade. Mas eis que ali jazia, barbaramente tombada.
O veículo ia lento, na pista única, arrastando o cadáver. Logo atrás, eu o acompanhava. Quanto olhei pelo retrovisor, uma longa fila de carros me seguia.
De repente, senti-me como se estivesse num cortejo fúnebre. E estava.
Ainda, pela posição dianteira que ocupava, supus que eu fosse da família próxima do morto. E era.
Tanto que se alguém indagasse meu grau de parentesco com aquela árvore, eu saberia responder:
– É minha irmã.
Onides Bonaccorsi Queiroz
Arco-íris sobre a Floresta Amazônica (Foto: Sérgio Vale)
Fonte: Verbo de Ligação